Esqueça a imagem clássica do relógio balançando acompanho pela frase: “Você está ficando com sono…”. Graças a um grande número de estudos recentes, a hipnose deixou de ser coisa de filme para ganhar legitimidade e está sendo combinada com terapias convencionais ou medicamentos no tratamento de muitos pacientes. “Ela tem sido amplamente perquisada pela psicologia e medicina. É utilizada inclusive em hospitais de prestígio, como o Columbia-Presbyterian e o Memorial Sloan-Kettering Cancer Center (ambos nos EUA), ajudando a controlar os efeitos colaterais das sessões de quimioterapia, e, no Brasil, no Hospital do Servidor Público, em São Paulo, e nos hospitais Vita e Universitário Evangélico, os dois em Curitiba (PR)”, conta o psicólogo Erick Heslan, CEO da Sociedade Brasileira de Hipnose e do Hipnose Institute, em Belo Horizonte (MG) – o segundo portal mais acessado no mundo sobre o assunto.
Durante a sessão, a técnica ajuda o paciente a chegar a um estado relaxado (por exemplo, ao nos concentrar em palavras calmantes), e, então, o profissional dá sugestões de como combater o problema em questão. A pessoa fica fisicamente alerta, mas extremamente calma mentalmente e aberta às palavras do terapeuta. “O tratamento possibilita o contato com o subconsciente, sem passar por julgamentos, críticas e avaliações que estão no nosso consciente. Isso permite que o paciente entre em contato com os seus reais sentimentos e consiga reordená-los”, explica o psiquiatra Leonard Verea, especializado em medicina psicossomática e hipnose dinâmica, de São Paulo. “E, ao contrário do que muita gente pensa, durante o tratamento a pessoa não fica sonolenta, inconsciente ou sem vontade própria, como um zumbi, ela apenas se sente meio entorpecida, mas com exata noção do que está acontecendo.”
Conheça a história de mulheres que se beneficiaram com a técnica e abra a sua mente.
Insônia
A escritora Patricia Morrisroe, 50 anos, de Nova York (EUA), não conseguia adormecer facilmente. O problema começou na infância e piorou, fazendo com que ela tentasse terapia e medicamentos. Mas, quando percebeu que eles não estavam fazendo efeito, decidiu por um hipnólogo. Após a consulta, ela levou para casa uma gravação que deveria ouvir antes de dormir. O que aconteceu nessa noite foi o que ela descreve como “o melhor sono da sua vida”.
Pessoas com dificuldade para dormir são ótimas candidatas para a hipnoterapia. A razão? A técnica ensina a combater os pensamentos repetitivos, característicos desse quadro. Um estudo da University of Zurich (Suíça) mostrou que pessoas submetidas à hipnose tiveram aumento de 80% no período de ondas lentas, a fase mais profunda do sono. “E ela leva vantagem nos remédios usados para esse fim, já que não tem efeitos colaterais”, diz Erick.
Problemas de intestino
Quando tinha 25 anos, Amanda Santiago, de São Paulo, começou a ter dores no abdômen toda vez que comia. Seu gastroenterologista achou que ela tinha síndrome do intestino irritável, mas os ajustes que sugeriu, como fazer seis pequenas refeições por dia – em vez de três grandes –, não resolveram o problema. Finalmente, um médico encontrou o culpado: esvaziamento gástrico rápido, um problema que leva o corpo a forçar a passagem de alimentos ainda não digeridos pelo intestino. Para combatê-lo, Amanda foi encaminhada para um médico que estava usando hipnoterapia para tratar pacientes com problemas gastrointestinais. Ela não tinha uma boa expectativa, mas resolveu arriscar. Durante as sessões, Amanda focava em uma moeda presa ao teto, o que a ajudava a relaxar. Então o especialista descrevia um lugar tranquilizante e como isso a ajudaria a melhorar. O resultado foi excelente. Ela sentiu seus sintomas diminuírem imediatamente, apesar de a maioria dos pacientes ver resultados depois de seis sessões.
Assim como Amanda, muitas pessoas com problemas intestinais encontram alívio na hipnoterapia. “Uma média de75% das mulheres têm uma melhora significativa nos sintomas após o tratamento e mais de 80% continuam se sentindo melhor nos seis meses seguintes, graças à forte ligação que há entre a mente e o intestino”, diz Olafur Palsson, professor de medicina no University of North Carolina’s Center for Functional GI and Motility Disorders (EUA). “O cérebro manda sinais ao sistema digestório que influenciam na forma como ele deve contrair e relaxar para movimentar a comida, o que pode ser muito intenso, levando à diarreia, ou muito fraco, resultando em constipação. Esse tipo de tratamento ajuda a equilibrar essas mensagens, fazendo com que o trabalho ocorra adequadamente”, explica.
Ansiedade
Melissa, 25 anos, de Campinas (SP), utilizou a hipnoterapia para combater a sua ansiedade por cerca de uma década, já que a sua terapeuta disse que isso seria uma alternativa aos medicamentos. E esse foi um bom conselho: pesquisas mostram que a técnica ajuda a deixar as sessões de terapia mais efetivas. Quando ela se encontrava em estado relaxado, o profissional a levava por caminhos que a ajudavam a liberar os pensamentos negativos que a deixavam muito ansiosa. Quando a questão era uma viagem, por exemplo, ele a orientava a antever todos os passos do processo: fazer as malas, dirigir até o aeroporto, passar pela segurança, embarcar no avião, o voo etc. Quando chegava a realidade, ela conseguia encarar tudo com muito mais calma.
Atualmente, a ansiedade de Melissa está controlada com auto-hipnose, uma técnica que ela aprendeu durante o tratamento: ela relaxa a mente e, então, repete várias vezes algumas frases que seu terapeuta utilizava para ajudá-la em situações de estresse. A hipnose também é muito eficiente para pessoas depressivas.
Nesse caso, os pacientes recebem mensagens para lidar com os sentimentos desconfortáveis, fazendo com que a pessoa consiga liberar os gatilhos que geram a tristeza assim que eles surgem. Quando incorporada à terapia cognitiva comportamental, o método consegue reduzir o tempo de tratamento – muitas vezes pela metade.
Dor
Gisele Bündchen afirma ter usado a hipnoterapia para combater as dores do parto e, assim, abrir mão da anestesia. O relato da modelo no documentário The Business of Being Born (2008, disponível na Netflix), convenceu Lauren Fong, 37 anos, CEO de uma companhia de produção digital de Los Angeles (EUA), a frequentar aulas de hipnose para essa finalidade quando ela estava grávida de cinco meses. Nos quatro meses seguintes e durante as 36 horas que ficou dando à luz sua filha, ela ouviu gravações com afirmações como “meus músculos estão trabalhando em harmonia para promover um parto mais fácil”, que foram recomendadas pelo especialista que ministrou o curso. “Durante o processo, eu passei por momentos de desconforto, mas não senti dores muito fortes a ponto de precisar gritar”, lembra.
Especialistas ainda não conseguiram decifrar como a hipnose ajuda nas dores do parto, mas Olafur suspeita que ela auxilie a reduzir a tensão que dificulta a movimentação do bebê pelo canal vaginal. E esse tipo de desconforto não é o único que pode ser aliviado com o método. “Estudos mostraram que a hipnose pode ser eficaz no tratamento de uma série de condições, incluindo fibromialgia, artrite e câncer”, conta Erick. “Ela é utilizada para desviar a atenção do paciente do problema, fazendo com que o seu cérebro o interprete de uma maneira diferente e muito menos desagradável”, explica. Pesquisas também mostraram que ela pode ser eficaz para combater dores crônicas. Nesses casos, o sistema nervoso continua mandando mensagens de incômodo para o cérebro mesmo quando o problema já foi tratado. A hipnose ajuda a reverter isso. A maioria dos pacientes relata sentir menos incômodo depois de cada sessão e apresenta uma melhora significativa depois de quatro consultas.
Testamos
Depois de receber um convite da nutricionista Pollyana Esteves, mestre em neurolinguística
e hipnose, para participar do Neuro Fit, um programa que usa a hipnose com a finalidade de perda de peso, Ale Kalko, diretora de arte da WH, resolveu experimentar a técnica. “Meu metabolismo é chatinho e me obriga a diminuir muito a ingestão de calorias e
aumentar a prática de atividade física para conseguir ficar em paz com a balança”, conta.
Ela se submeteu a cinco sessões em que a profissional usava métodos que deixam
a pessoa mais relaxada para, assim, entrar em contato com o seu subconsciente, sem os
bloqueios do consciente. Ale percebeu que a técnica auxiliou a identificar eventuais traumas e gatilhos que costumavam gerar uma descompensação emocional, que a levava a
descontar na comida. “Eu ainda não perdi peso, mas já consegui mudar a minha relação com as atividades físicas, encarandoas como fonte de bem-estar. A natação se transformou no meu porto seguro – se fico muito estressada e chateada, logo sinto a necessidade de
cair na piscina”, conta.
*A matéria acima, originalmente entitulada “Uma nova cura”, saiu na ed. 97, de setembro de 2017. Quer ler a edição completa? Todas as revistas estão disponíveis na versão digital em nossos aplicativos. Cliqui aqui e saiba como.